Justiça torna réu servidor aposentado da Seplan e empresário por suspeita de cobrança de propina em Bauru

A ação é resultado de um inquérito que apurou a cobrança e recebimento de propinas na Seplan para autorizar a liberação de projetos de empreendimento e obtenção do documento “Habite-se”, um certificado de conclusão da obra. Prefeitura de Bauru denuncia à Justiça servidor aposentado da Seplan por cobrar propina
Reprodução/TV TEM/Arquivo
A Justiça aceitou a denúncia do Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado de São Paulo (Gaeco) contra o servidor aposentado da Secretaria de Planejamento (Seplan) de Bauru (SP) Wagner Bertolucci e o empresário Élcio Luiz de Castro por corrupção passiva. Segundo o Gaeco, a dupla é suspeita de exigir dinheiro em troca de regularizar a documentação de um prédio residencial na cidade.
A denúncia oferecida pelo Gaeco, órgão do Ministério Público de São Paulo (MP-SP), foi recebida no dia 20 de julho pelo Poder Judiciário, transformando os acusados em réus no processo.
A ação é resultado de um inquérito que apurou a cobrança e recebimento de propinas na Seplan para autorizar a liberação de projetos de empreendimento e obtenção do documento “Habite-se” – certificado de conclusão da obra.
Segundo o MP, a investigação demonstrou que a construtora responsável pelo empreendimento não havia providenciado a averbação junto à matrícula do imóvel e nem obtido o “Habite-se”, documento emitido pela prefeitura de Bauru para garantir que uma construção seja executada seguindo as normas estabelecidas.
Além disso, a obra foi executada em desacordo ao projeto inicial, já que as garagens e suas coberturas não constavam do plano aprovado pelo Poder Executivo local.
Ainda segundo a investigação, com o objetivo de regularizar a situação, o síndico do condomínio procurou Élcio Luiz de Castro, dono da construtora responsável, e foi orientado por ele a pagar a quantia inicial de R$ 5 mil ao servidor responsável, Wagner Bertolucci, de modo que ele “fizesse vista grossa” e expedisse o “Habite-se”. Posteriormente, o valor cobrado passou a ser de R$ 4 mil.
De acordo com o Gaeco, a intermediação realizada pelo empresário se revelou indispensável e imprescindível para que o funcionário público “pudesse solicitar os valores indevidos com mais segurança, sem necessidade de tanta exposição (…)”.
O síndico, no entanto, gravou os telefonemas com os suspeitos e os entregou ao MP antes de realizar os pagamentos, dando origem à denúncia.
O g1 tentou contato com réus no processo, mas até a publicação desta reportagem não conseguiu contato com a defesa.
Áudios de propina
Nas gravações é possível ouvir o diálogo entre o denunciante, síndico de um condomínio, e outras duas pessoas, o servidor público municipal da pasta, Wagner Bertolucci, e do construtor Élcio Luis Castro, que são investigados.
Em um dos diálogos o servidor público municipal pede propina no valor de R$ 5 mil para liberar a documentação de um imóvel. Em outra conversa o construtor tenta convencer o denunciante a participar do esquema (veja abaixo transcrição de trechos dos diálogos).
Gravações telefônicas revelam suspeita de cobrança de propina na Seplan em Bauru
As gravações motivaram a emissão de mandados de busca e apreensão nas casas dos suspeitos, emitidos pela 2ª Vara Criminal da Comarca de Bauru. A ação contou com apoio policial.
À época, a Secretaria de Planejamento de Bauru informou que o servidor investigado havia sido afastado de suas funções e que o caso estava sendo apurado pela Corregedoria-Geral do município.
Confira abaixo, um trecho do diálogo entre o denunciante e o servidor:
Denunciante: E no caso o que está faltando lá pra gente acertar isso ai?
Servidor municipal (Wagner): As coberturas que não está no projeto né. De garagem.
Denunciante: E como seria pra gente resolver isso ai?
Servidor municipal (Wagner): Seria R$ 5 mil. Liberando esse dinheiro eu libero o Habite-se em seguida. Eu não tenho como liberar se não tiver esse acerto ai. Eu não tenho como liberar. E se você for mexer no projeto vai ficar bem mais caro. Porque ai tem de alterar o projeto, Bombeiro… fica bem mais caro.
Veja a transcrição da conversa gravada entre o denunciante e Élcio:
Construtor (Élcio): Eu, eu, como amigo vou te dar um conselho: Não deixe esse negócio ir pra frente não. Tenta dar alguma coisinha pra ele pra morrer ai e acabar com isso de uma vez por todas.
Denunciante: Ah, beleza. Tranquilo. Tranquilo
Construtor (Élcio): Eu acho né. Não sei. Eu sei que você é uma pessoa muito correta. Você não pactua com isso. Nem eu. Entendeu. Mas tem hora que infelizmente a gente tem que se vender né?
Denunciante: É complicado!
Construtor (Élcio): Algumas coisinhas… Complicado, eu sinceramente não gosto. Eu penso como você. Mas, vocês estão pagando tudo certinho, já está tudo certo. O problema é que pra resolver isso vocês vão gastar muito. E se ele pode fazer vista grossa e liquidar este assunto fica mais barato.
Corrupção na Seplan
A Prefeitura de Bauru (SP) já havia ajuizado uma ação civil pública contra o servidor aposentado da Secretaria de Planejamento (Seplan) suspeito de cobrar propina de munícipes em troca da liberação e aprovação de projetos.
Na ação, a Procuradoria do município pede a aplicação das punições previstas na lei de improbidade administrativa e a conversão da pena de perda do cargo público em pena de cassação da aposentadoria.
Em nota, a Seplan justificou o ajuizamento da ação pelo fato de ter reunido “amplo arcabouço de provas de que o servidor aposentado, quando na ativa, teria se valido do cargo para atuar em interesse de particulares mediante remuneração”.
Segundo a Corregedoria, as investigações começaram depois que um morador denunciou o servidor por supostamente cobrar propina duas vezes em um mesmo caso.
De acordo com essa denúncia, em 2012 o servidor da Seplan teria vendido uma liberação de projeto ao morador, que pagou a propina, mas precisou de mais documentos em 2019. O servidor, então, pediu mais dinheiro ao munícipe, que não aceitou pagar nova propina e resolveu formalizar a denúncia.
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