Sâmia Pedrassi e o marido, moradores de Bauru (SP), foram habilitados no processo em 2021. Futura mamãe conta que a ideia de compartilhar veio da vontade de mudar o olhar da maioria sobre a adoção. Sâmia está a espera do primeiro filho pela adoção em Bauru
Arquivo pessoal
“Indefinido pra mim era se eu seria ou não mãe”. Para essa dúvida, a personal trainer e vendedora Sâmia Pedrassi Alves da Silva, moradora de Bauru (SP), já encontrou a resposta. Inclusive, ela e o marido, o técnico de segurança da informação Rudney Vinicius Gonçalves de Souza, estão grávidos.
Mas essa gestação não se desenvolve no útero da mãe e, por mais difícil que seja essa parte, não tem um período definido para terminar. É uma gestação do coração, como muitos definem a adoção. “Estamos grávidos do coração”, define.
Diferente da dúvida que tinha se seria ou não mãe, a forma como seria mãe era uma certeza na vida de Sâmia.
“Há mistérios entre o céu e a terra que ninguém nunca vai encontrar uma explicação racional. E meu desejo de ser mãe, caso fosse, via adoção é um desses mistérios. Ele existe desde sempre, sem motivos ou grandes explicações”, afirma.
Apesar desse desejo pessoal bem definido, foi necessário um ano inteiro para decidir e planejar a forma como um filho chegaria à família.
“A gente sentou e passou 2020 decidindo primeiramente se seríamos pais, depois se seria biológico ou por adoção. E o Rud [como Sâmia chama o marido], além de ter muita vivência com vários familiares próximos adotivos, sabendo do meu desejo, também optou pela via adotiva. Mas foi muito bem conversado, porque eu não suportaria a ideia de que ele estivesse fazendo algo só pra me agradar, e não porque fosse de verdade o desejo dele.”
Personal trainer e o marido estão “grávidos do coração” como definem a espera pelo filho por meio da adoção
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A partir dessa decisão, Sâmia fez o cadastro, em janeiro de 2021, no Sistema Nacional de Adoção (SNA) e foi orientada a procurar a Vara da Infância e Juventude da cidade. (Informações sobre a adoção no Brasil estão disponíveis no site do Conselho Nacional de Justiça).
Porém, nesse período ainda estávamos no auge da pandemia, com vários serviços fechados ao público. Por isso, os procedimentos que incluíram o envio de toda a documentação e participação de um curso para pais, por exemplo, foram feitos de forma online.
Um dos passos também do casal foi oficializar a união. No Brasil, é possível adotar uma criança de forma solo, porém se a adoção será feita pelo casal é preciso oficializar por meio da união estável ou do casamento civil.
“Primeiro contamos para os meus sogros e depois assinamos a união estável (poderia ser casamento, mas demorava mais) e em fevereiro enviamos toda documentação por e-mail. Em seguida escrevemos a cartinha para os meus pais contando da adoção, não tem uma vez que eu não veja esse vídeo e não chore”, lembra. (Veja o vídeo abaixo).
‘Grávidos do coração’: futura mamãe compartilha experiência da espera do filho pela adoção
Habilitados
Com a documentação enviada, começou uma rotina de estudos que incluiu conhecer a realidade de outras famílias que estavam passando ou passaram pelo processo de adoção e também o conhecimento da legislação.
“Estudamos o ECA [Estatuto da Criança e Adolescente] pra entender como o estado pensa e atua, comecei a seguir várias famílias adotivas e páginas que falavam e informavam sobre o assunto, relatos de famílias que “devolveram” – é um termo que evito e não gosto, mas pra entender o que estou falando – famílias que recebem uma criança, mas, por algum motivo, acabam desistindo dela e a criança volta pra tutela do estado e pra adoção, começamos a ler e ouvir de tudo.”
Sâmia lembra também que foi nesse período que começou a “primeira espera” pelo filho.
Para marcar essa espera, assim como muitos casais, Sâmia e Rudney fizeram um ensaio fotográfica da ‘gestação do coração’
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“A gente estudava, lia, mas tipo, de verdade, para gente nada estava acontecendo. Foi aí que fui atrás de informação e meados de maio descobri que nosso processo tinha sido aberto e que eu tinha uma senha pra acessar. Parece besteira, mas foi a primeira alegria e a primeira sensação do ‘está acontecendo mesmo’.”
“São coisinhas pequenas, mas que foram validando e tornando cada vez mais real a nossa ‘gestação’”, completa.
Do acompanhamento online dos passos do processo, o casal passou pelo curso de pais em agosto de 2021 e pela entrevista com a assistente social e a psicóloga em novembro do mesmo ano. Um momento marcante para a futura mamãe.
“Foi em uma segunda-feira à tarde. Eu lembro até que roupa eu estava, porque eu pensei na roupa que eu ia colocar. Eu ia ser avaliada, então não queria passar uma imagem errada, mas também não queria passar algo que eu não fosse.”
Depois das entrevistas e o preenchimento do perfil da criança que pretendem adotar, o casal foi considerado apto e habilitado pelo juizado da Vara da Infância e Juventude para adoção no dia 16 de dezembro de 2021.
“Ali começou de verdade a nossa ‘gestação do coração’, pois foi ali que entramos pra fila de espera do Sistema Nacional de Adoção. Chorei nesse dia. Eu realmente me emocionei por saber que a partir desse dia a qualquer momento nosso filho poderia chegar”, afirma.
Atualmente, Sâmia e Rudney estão na 37ª posição na fila da adoção, que pode ser acessada pelo casal na internet.
Diário da mãe adotiva
Em março desse ano, Sâmia criou um perfil no Instagram para dividir essa experiência de estar à espera do filho pela via da adoção com outras pessoas. A ideia veio da vontade (e da necessidade) de mudar o olhar da maioria das pessoas sobre a adoção.
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“Pra mim, repito, pra mim, é uma espera linda e de muita alegria, e não tem porque não dividir isso com todos ao nosso redor. Mas ao mesmo tempo foi me surgindo a vontade de explicar mais sobre esse mundo adotivo e ajudar as pessoas a entenderem melhor como é e como funciona. “
Com o perfil “Diário a mãe adotiva”, a futura mamãe criou um espaço online para compartilhar relatos, informações, além dos registros fotográficos dos momentos importantes dessa espera que depois podem ser divididos com o filho.
“A importância está no registro de todos esses momentos de uma forma que um dia quero sentar com meu filho e mostrar o quanto eu quis, amei e esperei por ele.”
Ela ressalta também que nesse espaço criou vários laços de amizades virtuais de mulheres e casais que estão também vivendo essa gestação do coração, além de pessoas que são filhos adotivos e dão a oportunidade de ter uma visão de como tudo é para a criança que chega a uma família por meio da adoção.
Embora seja um espaço de compartilhamento da sua experiência pessoal, Sâmia espera que seja uma oportunidade colaborar com a quebra de muitos pré-conceitos sobre a adoção. Para que ela seja entendida não como uma última alternativa ou um ato de caridade, mas como uma, entre tantas outras, formas de uma mulher ser mãe (e um homem ser pai).
“Precisamos falar mais e mais sobre a adoção. Para que crianças e adolescentes sejam realmente protegidos e tenham todos os seus direitos garantidos, que mulheres sejam mais validadas e respeitadas por seus desejos e decisões. Que o tempo de espera seja mais curto e crianças fiquem menos em lares temporários ou em acolhimento. Que a adoção seja vista no plural, como ela realmente é, uma opção por diversos motivos e vontades, em diferentes contextos e situações, mas que tem somente um fim: a parentalidade válida e como outra qualquer.”
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Dificuldades da espera
Oficialmente não existe uma estimativa de quanto tempo um processo de adoção pode levar, ele pode ser mais curto ou mais longo dependendo de uma série de fatores, como o perfil da criança escolhido pelos candidatos à adoção.
Sâmia está há 1 ano e cinco meses nessa espera e nesse período se passaram dois Dia das Mães e agora prestes a vivenciar o seu terceiro, ela conta que se sente mais “apta” a vivenciar essa data.
“Ano passado eu ganhei flor da minha sobrinha Luiza junto com as outras mamães da família, me emocionei, mas segurei. Esse ano eu acho que estou me sentindo mais mãe, me sinto ainda mais pertencendo à data, sabe? A qualquer hora vou ser mamãe, estou esperando meu filho, então me sinto mais emocionada.”
A espera até aqui tem sido tranquila, segundo Sâmia, mas o casal enfrentou momentos difíceis, como a morte de pai de Rudney.
“Quando eu soube do diagnóstico terminal do meu sogro, ali eu pedi muito, mas muito mesmo que meu filho chegasse a tempo de conhecer o avô. Foram dias em que a adoção ficou ‘difícil’ em relação à espera. Porque eu queria muito mesmo que tivesse dado tempo”, lamenta.
“Hoje, eu peço que não demore mais muito, nosso pequeno já está na nossa programação de vida, a gente fica imaginando como vai ser, já não fazemos planos sem ele, e agora a gente está literalmente só esperando ele.”
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À espera do filho pela adoção, personal trainer compartilha experiências na web: ‘Gestando no coração’
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